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Rita, Elis e a forma como fazemos o luto de nossas grandes artistas

Beto Seabra - 10/05/2023




Minha família estava de férias no Rio quando eu soube, pela apresentadora do telejornal Hoje, que Elis Regina havia morrido. No dia seguinte eu fui até a banca de jornais logo cedo para comprar o JB e saber mais sobre a triste partida da Pimentinha. No ano anterior eu havia visto meu primeiro e único show de Elis, em Brasília, durante o Festival Interno de Música do Colégio Objetivo, o FICO.


Eu concorri com uma música naquele festival e pude frequentar o mesmo espaço dos artistas. Na verdade, a música era de uns amigos, um tango belíssimo, que puseram meu nome lá, sabe como é, eu estudava no Objetivo e eles não. Já minha música, uma canção tristonha que falava dos velhos problemas da América Latina (fome, pobreza e violência), não foi classificada. Eu era muito jovem, mas já sabia alguma coisa sobre música brasileira, de ouvir e ler nos cadernos culturais. Quando Elis chegou ao local do show - que aconteceu no antigo estádio de futebol Pelezão, demolido nos anos 2000 para virar um condomínio habitacional de luxo – os seguranças não nos deixaram chegar perto e a escoltaram até o camarim.


Eu com meu crachá de “compositor” estava todo serelepe, querendo ver todos os artistas, pois além de Elis, o FICO trouxe Luiz Gonzaga, o Rei do Baião!, e Ney Matogrosso, recém-saído do Secos e Molhados. O Objetivo era um dos colégios mais ricos do Brasil, que inovara ao lançar aulas-espetáculos em verdadeiros auditórios, onde os professores cantavam, dançavam e ensinavam dicas para passar no vestiba.


Até o oitavo ano eu estudara em escolas públicas e para mim foi um baque fazer o segundo grau (atual ensino médio) em um colégio particular do porte do Objetivo. No primeiro ano eu ainda me esforcei, fiquei entre os primeiros do colégio (a cada bimestre, o aluno recebia o boletim com as notas e a colocação geral), um troço bem competitivo. Mas no segundo ano comecei a sentar no fundão, entrei na galera do futebol e no terceiro ano já estava fazendo música e um jornalzinho mimeografado sobre futebol com os amigos. Me lembro do nome até hoje: De olho na bola!


Lembrei de tudo isso ontem quando soube da morte da Rita Lee. Não só porque as duas foram grandes amigas no passado (não deixem de ler o livro Rita Lee, uma autobiografia), mas principalmente pela forma como as duas mortes foram recebidas por nós, fãs e admiradores das duas artistas. Quando eu soube da Elis fiquei muito triste e fui conversar sobre a tragédia com uma prima. Colocamos um disco dela para tocar e fizemos uma homenagem singela à cantora. Nos anos seguintes é que fomos assimilando o fim de uma das maiores vozes da música brasileira de todos os tempos.


Passados mais de 40 anos, como chegou até nós a notícia sobre a partida de Rita Lee? Em pouco mais de duas horas me chegaram tantas coisas sobre o acontecimento, de notícias a fotos, passando por músicas em diversas plataformas e textos escritos por ela, que ao final do dia eu já estava saturado de Rita Lee. Sério. Gosto muito da música dela, mas hoje já não posso mais ler ou ouvir falar sobre a notícia da morte dela. É como se, em 24 horas, tivessem derramado um caminhão de fatos, fotos, links de músicas e de mensagens de textos sobre nós.


Tenho a impressão que essa avalanche de coisas soterra também as lembranças pessoais que temos, cada um de nós, da Rita Lee. Se pudesse enviar uma mensagem do além, acho que ela diria: “Me cansei de lero lero! Não quero luxo, nem lixo, meu sonho é ser imortal meu amor!”.

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