Jornalista usa ficção para denunciar crime contra criança durante a ditadura militar brasileira
A literatura pode estar a serviço da denúncia? Sim, é o que pensa o jornalista brasiliense Roberto Seabra, que acaba de lançar pela Editora Camará seu primeiro livro de ficção: “Silêncio na cidade”, um roman à clef sobre um caso rumoroso ocorrido em Brasília nos anos 1970, em plena ditadura militar.
Na ficção, Tino Torres é um policial aposentado que há 40 anos guarda a história de um crime impune. Em setembro de 1973 a menina Ana Clara, de apenas 7 anos, foi encontrada morta em um matagal da Asa Norte, bairro de classe média da cidade, com sinais de asfixia e violência sexual.
Incumbido de investigar o assassinato da criança, Tino Torres esbarra em ordens superiores no sentido de parar com o trabalho. Decide então continuar investigando o crime por conta própria e com a ajuda de Eduíno, duble de motorista e auxiliar de investigações, Vera Hermano, perita criminal novata, e Geramundo, repórter do principal jornal da cidade.
Revisitando o passado e fazendo reflexões no presente, “Silêncio na cidade” reconstrói a trama que levou a menina à morte e revela as conexões do crime com filhos de figuras importantes do governo militar.
Crônica de época
O escritor João Almino, autor do premiado Cidade Livre, e que assina a orelha do livro, lembra que “a ficção de Roberto Seabra pode ser lida como uma crônica de época e do caso famoso na história da cidade, narrada da perspectiva do policial que liderou as investigações”. Mas também escreve que não se trata de um livro-reportagem, e sim de um romance, com todas as qualidades de uma narração verossímil e minuciosa.
O caso famoso citado por João Almino é a morte da menina Ana Lídia, registrada na memória dos moradores de Brasília. O crime foi arquivado e nunca ninguém foi punido, apesar da quantidade incrível de provas encontradas à época, que depois desapareceram.
No prefácio do livro, a escritora e professora aposentada de Comunicação da Universidade de Brasília (UnB), Rosângela Vieira Rocha, faz um relato emocionado sobre a história. Isso porque, em 1973, ela era amiga da irmã de Ana Lídia e frequentava a casa da família. “Convivi com Ana Lídia, menina loura, magrinha, extremamente viva, rosto de querubim, falante e de voz meio estridente, com enormes olhos azuis”.
Em seguida, Rosângela Vieira Rocha compara a ficção com a realidade. “Utilizando nomes ficcionais parecidos com os mencionados na época, o que é óbvio para quem acompanhou a ampla cobertura do caso feita então por jornais, emissoras de rádio e TV, Seabra constrói uma narrativa possível e até mesmo provável para contar a história de Ana Lídia. Ou de Ana Clara, para ser exata.”
Censura
O autor, entretanto, mantém o tempo todo a estratégia de tratar sua história como ficção, ainda que assuma o tom de denúncia em várias ocasiões. Na opinião de Seabra, “a literatura pode e deve fazer, hoje, o papel que a imprensa e a polícia não puderam fazer em 1973, em razão da censura e da intervenção de autoridades superiores nos rumos da investigação”.
“Silêncio na cidade” é o primeiro livro lançado pela Editora Camará, também de Brasília. O ilustrador Cacá Soares fez os desenhos do miolo e da capa do livro. O projeto gráfico é de Cristiane Dias, da Raruti Design.
Serviço:
“Silêncio na cidade”, livro de Roberto Seabra, 284 páginas, lançado pela Editora Camará, em outubro de 2017.
Valor: R$ 40,00
Locais de venda:
Banca da Conceição (SQS 308)
Banca do Molina (SQN 108) Mais informações pelo e-mail editoracamara@gmail.com
Telefone para entrevistas com o autor: (61) 9 9970 8574