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Precisamos conversar sobre Marielle


Roberto Seabra - 15/03/2018


É preciso escrever sobre Marielle Franco. Ainda que a vida continue, ou que nesse exato momento outras mulheres e outros homens estejam sofrendo com a violência urbana ou rural que paralisam o País, é preciso falar sobre a execução de Marielle.

Sabemos que mais de 50 mil pessoas perderam a vida no ano passado, por tiro, facada ou de forma pior. E que milhares de crianças sofrem violência, em casa ou nas ruas. E que também o nosso trânsito vai atropelar, matar ou amputar outros milhares de vítimas nos próximos meses. Sabemos tudo isso, mas, nesse momento, é preciso chorar por Marielle.

Manifestantes protestam em Brasília contra o assassinato de Marielle (Foto: Cleia Viana/Câmara dos Deputados)


A violência no Brasil ficou insuportável, especialmente para quem mora nas favelas. Marielle lutou contra isso e, por essa luta, perdeu a própria vida. É estranho dizer que uma pessoa morreu enquanto defendia a vida, dos outros.

Alguém pode dizer que isso acontece todos os dias, em especial com homens e mulheres que trabalham na polícia. Só no Rio de Janeiro, dezenas de PMs perderam a vida nos últimos doze meses por desempenharem suas funções. Mesmo assim, é preciso conversar sobre Marielle.

Nossa vida tem um lado real, mas também simbólico. E quando se tenta matar um símbolo, as vidas de todos sofrem com isso. Marielle morreu, mas o que ela simboliza permanece vivo.

Marielle acordava e ia dormir pensando em como fazer para cessar as mortes de inocentes em Acari, na Zona Norte do Rio de Janeiro. Era uma militante dos direitos humanos, mas isso não explica tudo.

Palavras viram rótulos e se afastam da verdade. Marielle era uma mulher corajosa, mãe de uma filha, e que encontrou na política uma forma de lutar pelo bem comum. Não era lobista, não representava grupos poderosos. Era uma mulher do povo.

Em ano eleitoral, a violência vira moeda de troca. Governos e políticos se aproveitam das tragédias alheias para propor fórmulas mágicas para enfrentar a criminalidade. Marielle sabia que tais fórmulas não irão funcionar. Viu isso de perto, em Acari, e denunciou o assassinato de jovens pela polícia. Pagou com a própria vida.

Bandidos fardados sujam a imagem da corporação policial. Marielle também sabia disso e pedia uma “limpeza” na PM, juntamente com políticas públicas e reformas na legislação para reduzir a violência urbana.

Mas, por ser mulher, negra e com posições avançadas, Marielle sofria todos os tipos de ameaças. No dia 8 de março, enquanto fazia um discurso na Câmara Municipal do Rio denunciando a violência que mata 12 mulheres por dia no Brasil, ela foi interrompida por um homem na galeria do plenário, que gritava pela volta da ditadura militar. “Não aturarei de um cidadão que vem aqui e não sabe ouvir a posição de uma mulher eleita Presidente da Comissão da Mulher nesta Casa”, disse Marielle.

Esse caso mostra que a atuação de Marielle incomodava muita gente. Mas acredito, num arroubo de esperança, que a tragédia que a morte dela representa incomode muito mais a partir de hoje.

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