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A melhor rádio do mundo


Roberto Seabra - 21/12/2017


Sempre que viajo de carro pelo interior do Brasil ou dirijo em outros países gosto de ouvir o que as rádios locais tocam. Já ouvi de tudo, em matéria de música e noticiário, mas até o momento não encontrei uma cidade que tivesse uma programação musical radiofônica tão boa e diversificada quanto Brasília. Rádio Nacional, Cultura, Brasília Super Rádio, e mais: Rádio Câmara, Justiça, Senado, Verde Oliva... Em cada uma delas, uma programação diferente, onde se ouve da ópera ao caipira, passando pela MPB, choro, samba, jazz, blues, reggae e uma infinidade de ritmos.

Certa vez fiz uma experiência que vale relatar aqui. Em menos de uma hora, movimentando o dial do rádio do meu carro, contei mais de vinte gêneros musicais diferentes que tocavam em rádios da cidade, só para citar alguns que não aparecem na lista do parágrafo acima: fado, bossa nova, valsa, rumba, maxixe, baião, guarânia, rock, sertanejo etc.

Alguém poderá dizer que hoje está tudo na Internet e que basta acessar qualquer uma das milhares de emissoras de rádio que existem na rede para ouvir o que quiser e quando quiser. Pode ser. Mas nada substitui as ondas sonoras que se propagam Brasil adentro e mundo afora. Ouvir música no rádio do carro, de casa ou do celular ainda é um daqueles prazeres que nem mesmo a tecnologia mais avançada conseguiu acabar. O rádio traz sempre alguma surpresa: uma música que nunca ouvimos antes, uma informação nova, uma voz diferente.

Li uma entrevista que o músico Chico César deu ao escritor e radialista Ruy Godinho, autor do livro/programa Então, foi assim?, que conta os bastidores da criação musical brasileira, e que faz parte da programação do rádio brasiliense. O compositor paraibano nos conta que cresceu ouvindo rádio na zona rural de Catolé do Rocha, nos anos 60 e 70, e pelas ondas hertzianas conheceu a música nordestina de Jackson do Pandeiro, Marinês e sua gente, Luiz Gonzaga, João do Vale, Dominguinhos, entre outros. Mas também escutava Fevers, Caetano Veloso e Roberto Carlos.

E foi no interior da Paraíba que Chico César ouviu, pela primeira vez, Mulheres de Atenas, de Chico Buarque, Ouro de Tolo, de Raul Seixas, e Pavão mysteriozo, de Ednardo. “O rádio era como se fosse a Internet da época, as coisas chegavam para todos”, diz Chico César. E além da música brasileira, ouviam-se também Beatles, Stones, Bee Gees e Donna Summer. “Tudo cabia naquele aparelhinho”, completa Chico César.

Fico tentando imaginar o que um jovem do interior do País consegue ouvir hoje nas rádios. Se tiver muita paciência, pode ser que ele encontre algo diferente, mas é muito provável que ele irá ouvir muito do mesmo. E mesmo que esse jovem tenha acesso à

Internet, como poderá saber o que pode ouvir? Ter “tudo” ao alcance dos dedos não é a mesma coisa que ter o “melhor”.

Em estudo publicado como tese de doutorado pelo Departamento de História da Universidade de Brasília (UnB), o compositor Clodo Ferreira, autor de grandes sucessos da MPB, mostra a importância das rádios para a criação de um mercado cultural local. E cita o exemplo da Bahia, onde as rádios regionais foram responsáveis pela disseminação dos ritmos baianos, que ganharam o Brasil e o mundo. Ou seja, programar músicas da sua cidade nas rádios, além de diversificar os ritmos e gêneros, ajuda a desenvolver a indústria cultural de uma região, gerando emprego e renda onde as rádios tocam. Então vejam que o mercado, e não só a arte, depende dessa diversidade para sobreviver.

Nossas rádios ainda possuem um papel importante na formação musical da nossa população. Mostrar a diversidade da música brasileira e internacional faz parte de um projeto de educação artística, posto que a música é a entrada para outras artes. Quanto melhor e mais variada for a programação musical das nossas rádios, maior a possibilidade de estarmos formando pessoas melhores, mais críticas e inteligentes, com gosto mais apurado e diversificado e não meros consumidores do batidão do momento.

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